A minha chuva, porque ela não cai num outro corpo qualquer como cai no meu, lava-me de cada vez que me deixa ensopada de uma água que não molha apenas. A minha chuva recorda-me, até pelo frio com que me estremece cada pedaço de pele, que estou tão vulnerável quanto ela decida deixar-me.
Águas que nos limpam de mágoas e de gente que a gente não reconhece. Águas que enchem rios que correm bem mais rápidos, para lugares que nem sempre serão aqueles onde queríamos estar. Águas de sabor doce, salgado e sem qualquer sabor. Águas que nascem em lugares inóspitos, mas aos quais chegamos bastando que a sede o exija.
Gosto de saber que acima de mim há bem mais do que tenho aqui, quando julgo estar apenas eu, quando sinto que o meu desejo de mais não pode ser concretizado. Gosto de tudo o que a chuva renova, mesmo quando cai fora de época, porque quando nada mais restar, vou esperar que reste o que nos "alimenta" verdadeiramente. Já fui menina e já dancei à chuva, em águas bem quentes, que me recordavam da minha pequenez, mas que me faziam ser ainda mais inocente, deixando para o futuro o que ele agora me trouxe. Seria capaz de o voltar a fazer, mesmo que me arrefecesse o corpo. Seria capaz de voltar a dançar descalça, num chão rugoso, mas bem próximo da humanidade de que sou feita. Vou certamente deixar que me toque um dia sem que eu queira fugir e para que me alimente da certeza que amanhã virá outra vez, contrariando o que muitos se impedem de ser.
A minha chuva será tão minha quantos os pingos que me tocam apenas a mim, apenas no meu corpo, e apenas no sorriso que lhe sei devolver!
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