Não te dou permissão. Não te vou sequer perdoar que tenhas vindo, com toda a força de um amor que lançavas em tufos de uma lã na qual apetecia enrolar, para depois levares até o que sou e não para que ficasse contigo! Não te dou permissão para que me magoes mais, para que mantenhas a minha pele em sangue, para que me exponhas aos males do mundo, sem qualquer reconhecimento do que já representei na tua vida, pela forma dedicada e de total entrega com que te mantive junto a mim, cuidando de ti todo, sabendo até do que falavam os teus olhos, os mesmos que pararam de olhar para mim.
Não tens o direito de simplesmente deixares de
me amar quando parecias alimentar-te até dos meus pensamentos. Quem foi que te
disse que podias apenas ir, num dia tão normal, e de um sol que ainda recordo
pelo calor que me subiu pelos pés que tinha descalços num chão que gelou, mas
que não impediu que eu ardesse de uma dor que
se mantém até hoje? Quem te permitiu apunhalar-me sem aviso, levando a minha
fé nos amores a que ainda deveria ter direito?
Não entendo a capacidade que muitos terão de
matar quem fizeram viver. De amachucar o mesmo papel no qual escreveram o que
era importante. De simplesmente arrancar, como se de um penso se tratasse, tudo
o que ambos implantaram, quando planeavam uma construção que se revelou
demasiado frágil.
Não te dou permissão para me continuares a
arrastar, impedindo-me até de sentir o que me fazia girar o mundo, sendo a
pessoa que sempre conheci, a mulher que admirava com um sorriso no qual cabiam
tantos, mas que agora se recusa a abrir. Não te dou permissão para me manteres
assim, agarrada a ti, amando o que já não existe e querendo quem nunca chegará. Não te dou permissão para ficares sequer no meu pensamento, e para que me preocupe com o que sentes e tens agora. Vou
apenas limpar o que permiti que sujasses e limpar-me do corpo que manteve o
meu prisioneiro num amor do qual nunca me atrevi a duvidar, mas que afinal não existiu.
Não tinhas o direito de me deixar no chão!
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