Conhecemo-nos através de amigos comuns, mas nem sequer simpatizámos de imediato um com o outro, achei-te demasiado calado e tu a mim demasiado segura. Quase não trocámos palavras nos primeiros dois encontros, mas olhávamo-nos com alguma curiosidade e começámos a acertar conversas. Tínhamos afinal muito em comum, éramos leitores compulsivos e admirávamos as palavras bem colocadas. Passaste a ser o meu analista literário, a pessoa a quem deixava, pela primeira vez e sem qualquer incómodo, ler o que escrevia até mesmo antes do meu agente.
Passámos um fim-de-semana só os dois, teimaste em acompanhar-me mesmo tendo-te dito que seriam dias de recolhimento. Tinha o livro para terminar e o frio que se fazia sentir naqueles dias de Dezembro levaram-me à minha casinha de eleição. Ficava em Manteigas, era de pedra, com uma lareira giganorme que aquecia do inverno, me revigorava, e me enchia dos sons do meu mundo. Sou uma solitária quando escrevo, preciso de silêncios ensurdecedores, de pequenos nadas que fazem o percurso da minha vida. Foi decorada por mim com tudo o que me permite ser eu mesma e tem uma áurea de criatividade, de misticismo, uma outra face obscura de mim.
Por vezes fazia intervalos, levantava a cabeça do teclado e vinha acarinhar-te, comíamos juntos, bebíamos o nosso vinho e dávamos beijos apaixonados, cúmplices, de quem se conhece há muitas vidas. Enrolados em mantas que eu mesma fizera com pedaços de tecidos de Cuba, do Ceilão e de muitos outros destinos onde me revi e encontrei, sem roupa, apenas com corpos sedentos que íamos alimentando num amor físico e emocional que jamais julgara possível.
Não sei como vamos ficar, não fazemos planos, não queremos assustar o destino, forçá-lo a nada. Por ora só queremos o tempo que nos couber e com ele multiplicar sensações, descobertas. Sabes-me bem, fazes-me bem…
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