Num sábado soalheiro com um grupo agradável, cheio de gente bem-disposta, num almoço que se prolongou, que se estendeu pelo prazer que estávamos a tirar uns dos outros, fomos falando de tudo, rindo, adivinhando sensações e tecordando os inícios de cada relação. Sem filhos por perto, sentimo-nos de novo jovens, descontraídos, sem pressas, mas igualmente apressados para conseguir ter um amor que nos completasse, conseguir a certeza na escolha, nos olhares da outra metade de nós.
A Ana estava um pouco cabisbaixa, mesmo rindo eu senti que não estava completa, que algo a magoava por dentro e fui olhando mais atenta, tentando descortinar pensamentos, até que finalmente, porque sou uma pessoa pouco dada a silêncios, derramei todas as palavras que certamente ela gostaria de ter usado.
- Sabes Paulo, estou para aqui a olhar-vos e pergunto-me, porque andas a desperdiçar tamanho amor?
- Não entendi - olhou-me baralhado.
- Não? Então eu explico. Tens uma mulher que enche os olhos de uma luz tão própria e intensa, sempre que te vê passar, a companheira que nunca adianta os passos, mas que os mantém próximos e acertados com os teus. Viste-a crescer fisicamente, aprender contigo a desinibir-se a partilhar o único corpo que reconhece e com o qual fica ainda mais bonita e mulher. Não precisas de perguntar porque o sei, nós falamos de tudo, sobretudo dos sentimentos que lhe negas, mesmo sabendo eu e todos aqui, que a amas realmente. No entanto escuta-me com a atenção de um condenado, assimila cada palavra, porque doravante te irão servir, responder e permitir que também tu cresças e te completes. A diferença entre quereres e seres realmente feliz, está na forma como amas e amar meu querido amigo, é esperar, desejar bem no fundo de nós, que cada final de dia tenha sido intenso o suficiente para dar ao outro tudo o que queremos para nós. Ver como o nosso cuidado consegue manter a alma tranquila, o sorriso aberto, o desejo inteiro de quem nos laçou as mãos e não pretende largar, quem carregará, se preciso for, cada tijolo de uma casa com todos os andares que vão crescendo até já não ser mais possível vislumbrar os contornos, porque se ampliou a caminho das estrelas, do azul que pacifica, do sol que nunca deixará de nascer e de se pôr.
Todos me olhavam deixando que o silêncio se instalasse e pudesse ter o protagonismo que ansiávamos servisse para mudar algo. Por esta altura a Ana deixava rolar grossas lágrimas e incitava-me para que não me calasse.
- Nunca te vi abraçá-la desenvolto, descontraído, jamais pronunciaste os amo-te que ela, como todo o comum mortal, tanto necessita de ouvir. Andas a arrastar-te na incapacidade de dares e de seres o homem que ela viu algures, num tempo que forças a que se distancie. Acorda meu amigo, amar só poderá ser sempre o começo e recomeço de tudo o que nos dará um final mais preenchido. Usa e abusa de quem te ama como ainda não fizeste por merecer.
O que vimos depois foi o beijo mais meigo, intenso, sentido, suplicado, sofrido e partilhado que a vida nos deixara alguma vez sequer imaginar. Deixei cair um sorriso vitorioso e chorei de felicidade vendo como, também a metade de mim, me acolhia de braços abertos.
- Anda cá minha guerreira, espero que consiga fazer-te sentir tudo o que descreveste, porque de contrário estou condenado a não te manter inteira. Sabes que te amo, não sabes?
Não foi preciso responder, desta vez os protagonistas desta história eram dois seres que pareciam estar a ver-se pela primeira vez, uma vez mais!
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