Vamos falar hoje, a sério, sobre nós os dois, a desnudar-nos por dentro a não deixarmos nada, mas mesmo nada por dizer. Foi sempre isso que te pedi e precisei de ti, mas acabou por nunca ser possível!
O que andámos afinal a fazer durante todos este tempo em que caminhámos por caminhos diferentes, afastados um do outro por milhas invisíveis e por milhares de minutos nos quais eu sempre te incluí, mas sem nunca saber onde e como estarias? Ninguém consegue caminhar no escuro muito tempo, sobretudo quando vê, quando já viu antes. As relações constroem-se falando de nós, mostrando-nos, dando-nos a conhecer para que o outro se possa incluir, para que sejamos dois, em quaisquer circunstâncias e percebendo que futuro existirá.
O tempo já corre demasiado depressa para ficarmos com dúvidas, para continuarmos à procura de sabemos lá nós o quê. Eu já só quero o que posso tocar, o que me acrescenta, o que não precisa de legendas, que é claro e real, o que não é difícil nem dúbio, as fantasias ficam para as sessões de cinema.
Já mostrei quem sou e o que consigo dar, caber-te-ia a ti provar-me que estive sempre certa, ou não. Vamos falar! Já o disse tantas vezes, mas como nunca foi convenientemente feito, deixou de importar e eu deixei de ver utilidade na insistência. Não o vou voltar a pedir e deixei de ter o que dizer...
Ela já foi tudo para mim. Ela já foi a minha miúda, mas mesmo nessa altura senti que era demasiado, muito desproporcional e assustador. Ela já quase me arrastou para a minha insanidade, mas soube como fugir!
Nem sempre os grandes amores ficam e por vezes são tão grandes que ameaçam engolir-nos. Nem sempre encontramos forma de encaixar quem nos quer demasiado, até quando achamos que conseguimos querer de igual forma. Ela já foi a minha primeira escolha. Queria estar onde estivesse e levá-la para onde mais ninguém a pudesse roubar de mim. Ela era a quem dava a mão e apertava com firmeza. Ela era quem tinha ao adormecer e a primeira pessoa que via ao acordar. Ela já foi a minha miúda, mas não a consegui manter, tive demasiado e não era exactamente isso que precisava.
Não me quero dividir. Não me apetece incluí-la sempre. Não tenho apenas um espaço, quero outros, quero ter-me outra vez, a mim e ao controlo da minha vida. Não sei se me arrependerei um dia, talvez nem chegue a acontecer, sou homem, não sonho com demasiado. Sou homem, não espero pela lua, o sol basta-me quando me aquece e a chuva nunca me perturba. Não quero querer demasiado, mesmo que já a tenha querido muito. Se lho disse, assim? Não, nunca seria capaz de o fazer, sou demasiado cobarde para explicar o que nunca teria forma de entender.
Ela era a minha miúda, mas terei outra e outra e mais . Sou eu no comando e assim permanecerei até que a vida me pare. Estou errado? Talvez, mas para já não me quero perder em quem já me perdeu. Não estou porque nunca estive. Não fui porque não sabia ser. Simples!
Perguntaste, então vou responder. Sou esta, assim como conseguiste ver. Gosto de mim, gosto de ti e de todos quantos me deixarem ser eu. Sou esta, tenho uma forma que pode até nem se encaixar na tua, mas quero continuar como me construí. Quero acordar cheia de energia, mesmo que exausta pela noite que não me deixou adormecer. Quero poder escolher os meus projectos e mesmo que em alguns esbarre e acabe totalmente consumida, sei que serei sempre EU em cada um. Quero poder rir de tudo, dançar como se o mundo fosse terminar e sossegar num sossego que todos estranham, até a gata. Quero decidir o que fazer, quem amar e porquê, até quando não perceber, NADA, das escolhas que faço. Quero continuar a curar-me do que não foi capaz de me matar, porque de amor não se morre. De amor ama-se mais e aprende-se a resistir a invernos rigorosos. De amor enchem-se os que armazenam para a vida. Do amor sei eu que amo TODA, sem qualquer reticência e a saber que apenas do TUDO se terá o MUITO que permanecerá. Sou esta. Caminho ao som da música logo pela manhã e percebo que me olham porque a energia que passo corre e percorre quem por mim passar. Sou esta e não vou mudar, não agora, até porque não teria forma de me melhorar e porque a ser mais ainda acabava a rebentar.
"Tu" serás o que se atreverá a entrar mesmo depois de constantes avisos, porque digo sempre, com toda a clareza, que não sou para todos os dedos. "Tu" serás quem eventualmente escolherei depois de nos termos escolhido, quando estiver pronta, quando me faltar pele, olhar, toque e entrega. "Tu" saberás que és quem desejo, porque nunca deixarei de o dizer. Uso as palavras, uma a uma, seguidas e frenéticas para que saibas que quem está contigo está mesmo. "Tu" terás direito ao que mais ninguém conseguiu, porque se estiver contigo foi porque uns quantos falharam.
É bom que estejas pronto para mim, porque eu prometo que a tua vida nunca mais será a mesma, que a virarei do avesso, e que não terás tempo para pensar em mais ninguém que não em mim. É bom que vás sabendo que eu sou esta, já que dizes querer arriscar. Vê lá se pelo menos jogas com as cartas todas, de contrário vou cobrar TUDO!
Seres únicos, éverdade, somos todos e sabemos, cada um à sua maneira, como fazer acontecer o que certamente fará falta a alguém. Ninguém se parece o bastante para ser realmente, parecido, é por isso que temos a nossa individualidade e devemos mantê-la, até quando colidir com quem não conseguir saber de nós. Estamos nesta vida, um a um, com lugares que devemos percorrer, almas às quais deveremos tocar e vozes que apenas nós seremos capazes de ouvir. Alguns de nós, de tão únicos, nunca seremos verdadeiramente vistos e ouvidos, mas quando o percebemos, sobretudo pelas vãs tentativas de nos enquadrarmos, de conseguirmos entender o que desejam os outros e o que fazem para o terem, aceitamos e seguimos, continuamos e paramos de esperar.
Seres únicos, tenho conhecido uns quantos, deixando que me enriqueçam acrescentando-me o que ainda não tinha, ou simplesmente recuando de forma cautelosa por serem de uma dimensão que a minha não reconhece. Os seres únicos que chegam e nos mudam de imediato, têm uma luz própria e são esses que vou querer por perto, dando-lhes tudo o que me oferecem e que pode até nem parecer muito, porque nunca peço, mas espero receber.
Deixa-te ser único, mantém o que te diferenciar, mas não sejas tanto que ninguém consiga perceber quem és realmente, porque aí não servirás nem a ti próprio!
O amor e a falta dele, transforma-nos para melhor e para pior. Somos o reflexo de tudo o que construímos e do muito que nos faltar, para entendermos que apenas teremos o que formos capazes de doar.